domingo, 3 de agosto de 2008

Um conto de transformação


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O Castelo Animado, desenho japonês baseado na obra da autora inglesa Diana Wynne, é uma história que apresenta insights poderosos sobre busca interior, transformação e reciprocidade em um nível profundo de leitura que faz todo o dogmatismo costumeiro dos contos de fadas soar bobo e leviano.

Sophie é uma jovem tímida e insegura que vive uma vida reclusa e solitária, tomando conta da chapelaria que herdou do pai. O lugar onde mora está na iminência de uma guerra e um incidente faz com que seu caminho se cruze com o do mago Howl, feiticeiro temido por devorar o coração de moças bonitas. O breve encontro desperta a ira da Bruxa das Terras Abandonadas, que transforma Sophie numa velha de 90 anos. A garota não pode contar a ninguém sobre seu feitiço e, por isso, foge indo parar justo no castelo do Howl.

O castelo é mágico e perambula pelo reino protegendo o paradeiro do bruxo, que é bastante poderoso, mas também narcisista e covarde. Neste lugar itinerante também vivem Markl, um garotinho aprendiz de mago e Calcifer, o demônio do fogo que habita a lareira e mantém o castelo em funcionamento... Mais do que resumir o enredo caleidoscópico do filme, o importante é dizer que nesta história nenhuma personagem é o que parece ser. A trama não se estrutura de forma convencional, uma vez que não há protagonistas e antagonistas declarados. Cada personagem lida com as dicotomias presentes em seu próprio interior e é somente quando todos encontram o equilíbrio interno que tudo ao redor se resolve.

É interessante observar essa dinâmica que não reduz as personagens em clichês maniqueístas. A jovem Sophie se transforma em uma velha, mas essa imagem não é nada além do que já estava presente em seu íntimo... fechada em sua loja de chapéus, encerrada em si mesma, protegendo-se da vida... escondendo-se como que em baixo de um chapéu invisível que tapava qualquer possibilidade de contato com a luz do sol (da vida)... Sua coragem só emerge quando ela se reconhece envelhecida, e não é por acaso que ela torna-se uma florista em determinado ponto da trama. O fato parece querer sinalizar ao telespectador que ela está desabrochando para a verdade da sua própria essência.

Aliás, o filme é repleto de imagens simbólicas. Não é de se pensar como algo tão sólido e estruturado quanto um castelo pode se movimentar, fazendo desfilar pelas janelas as paisagens mais diversas?! Isso mostra o quanto a instabilidade tem peso no enredo. Mostra o quanto tudo está em constante transformação... Daria até pra escrever outro post linkando essa idéia com o conceito de destruição criativa de um post anterior, já que é justamente disso que se trata a catarse de cada personagem e a soma delas para a construção do desfecho.

O complexo processo de purificação de cada elemento pontua o contexto do macro universo em que habitam. Assim, a iminência da guerra coincide com a inquietação interior de cada um; a eclosão da guerra, com a luta que cada um se viu obrigado a travar consigo. E é fundamental perceber que o termo da guerra só pôde ser alcançado quando todas as personagens foram capazes de se redimir, o que faz absoluto sentido se notarmos que havia uma estreita ligação entre elas. Apocalíptico, não?!

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